Quando eu era criança, tinha um sonho ousado.
Não era ser astronauta, nem descobrir um tesouro escondido.
Meu sonho era cantar Whitney Houston no programa do Raul Gil.
Sim, exatamente isso. Imagina só: eu, de vestido brilhante, microfone na mão, emocionando uma plateia ao som de I Will Always Love You. O detalhe, claro, é que eu não sabia cantar. Também não sabia falar inglês e, vamos combinar, meu carisma artístico era inexistente. Mas, para a Jéssica criança, esses eram só detalhes.
O tempo passou, como sempre passa, e os sonhos foram ficando para trás.
Vieram os estudos, o trabalho, a família, as responsabilidades.
A vida adulta tem essa mania de arquivar sonhos em gavetas esquecidas, como se eles fossem brinquedos velhos que já não nos cabem.
Mas, vez ou outra, algo cutuca. Uma memória, uma música, um desejo adormecido que insiste em despertar.
Foi assim que, em 2024, com 35 anos, decidi fazer algo que parecia absurdo: entrei em aulas de canto.
Não para ser uma nova estrela do The Voice ou brilhar em palcos internacionais. Nada disso. Entrei porque queria dar um presente àquela menina de vestido brilhante que ainda mora em algum canto de mim.
No começo, foi estranho.
Descobrir a própria voz é um processo quase íntimo, como aprender um idioma só seu.
Nas primeiras aulas, mal conseguia soltar um som que não fosse tímido.
Mas, aos poucos, fui me acostumando.
Aprendi que cada nota é como uma conquista. E, mesmo que meu timbre ainda esteja em construção e eu “arranhe” mais do que canto, é impossível não sentir orgulho de cada pequeno progresso.
Agora em dezembro, meu professor, Apollo — nome digno de alguém que guia vozes rumo ao Olimpo, não? — sugeriu gravar uma música de Natal.
Natal Todo Dia, do Roupa Nova. Uma escolha simples para muitos, mas, para mim, um Everest musical. Especialmente o refrão.
Ah, o refrão!
Pensem numa pessoa ansiosa. Multipliquem por mil. Era eu, tentando alcançar aquelas notas que insistiam em fugir.
Teve suor, teve crise, teve vontade de desistir.
No final, consegui? Não.
O refrão ainda é um desafio que me olha do alto, como quem diz: “Volte ano que vem.”
Mas a mágica está aí. Não é sobre o destino; é sobre a caminhada.
Se vou virar cantora? Provavelmente não. Minha coisa são os livros, sempre foram.
Inclusive, já coloquei na lista de metas para 2025: voltar a escrever com o coração.
Mas o que importa não é o resultado. É a beleza de fazer algo por mim, pela menina que sonhava e pela mulher que, hoje, tem coragem de tentar.
Porque não existe idade para realizar sonhos.
Seja no palco do Raul Gil ou na sala de um professor paciente, o importante é nunca deixar de ouvir a música dentro de você.
Mesmo que ela desafine.
Mesmo que o refrão pareça impossível.
Afinal, a vida, como um bom canto, é feita de tentativa e persistência.
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