Natal sempre foi uma espécie de termômetro do tempo para mim. Quando criança, era o ponto alto do ano, uma data que eu aguardava com a impaciência de quem mede o tempo pelas luzes piscando na varanda dos vizinhos. Eu acreditava em Papai Noel com uma fé que hoje invejo. A magia era quase palpável, como o cheiro do panetone recém-aberto ou o som do papel de presente sendo rasgado à meia-noite.
Ah, a meia-noite! O desafio de esperar acordada parecia uma aventura. Meu corpo pequeno, vencido pelo sono, tentava resistir enquanto minha cabeça encostava no braço do sofá. Quando finalmente chegava o momento, os olhos se arregalavam, e lá estava ele: o presente tão esperado.
Eu nunca questionei como Papai Noel conseguia entregar justo o que eu queria, mesmo sem internet ou listas enviadas por WhatsApp.
Mas nem todos os natais foram iguais. Alguns foram marcados pela ausência do meu pai. Militar, ele trabalhava em muitas datas especiais, e a cadeira dele à mesa ficava vazia. Naquele tempo, eu não entendia o peso disso. Para mim, era apenas uma questão de tempo até ele chegar, mesmo que fosse no dia seguinte. Mas, olhando para trás, vejo como essas ausências moldaram a nossa maneira de celebrar: com saudade, mas sem perder a alegria.
Depois, vieram os natais em que eu era a ausente. Enfermeira do pronto-socorro, vi a festa acontecer pelos olhos dos outros. Passei muitas noites cuidando de pessoas que precisavam de um milagre natalino no formato de uma bolsa de sangue, uma injeção ou simplesmente uma presença humana. Enquanto isso, minha família se reunia em casa, e eu sabia que as crianças estariam correndo ao redor da árvore, os adultos trocando histórias e risadas.
Era uma troca difícil, mas necessária.
Os natais mais mágicos, no entanto, foram os primeiros com meus filhos. Montar a árvore com eles foi como reviver a minha própria infância, só que com mais glitter e bagunça. Havia algo de encantador em ver os olhos deles brilharem diante das luzes piscantes, acreditando, como eu acreditava, que Papai Noel viria.
Escondíamos os presentes, simulávamos barulhos de trenós e encenávamos uma alegria quase teatral, mas profundamente sincera.
E agora? Agora os natais têm perdido um pouco da cor. As crianças crescem, a crença em Papai Noel desaparece, e a festa parece se tornar mais um item na lista de compromissos de fim de ano.
Onde antes havia entusiasmo, hoje há logística. Quem traz o pudim? Quem cuida da carne? Quando vamos montar a árvore? A data, que já foi um evento, virou um intervalo entre trabalho e descanso.
“Então é Natal, e o que você fez?”
A música me pergunta isso todos os anos, com uma insistência incômoda. E eu penso no que fiz, mas também no que não fiz.
Não resgatei aquela magia.
Não transformei dezembro em um mês de memórias inesquecíveis como foram os meus natais de criança.
Talvez o Natal, como tudo na vida, mude com a gente. Não é que ele tenha ficado menos importante; talvez ele tenha apenas assumido outra forma. Mais silencioso, mais reflexivo. Menos sobre Papai Noel e mais sobre o que conseguimos construir ao longo do ano.
Ainda assim, sinto falta do brilho, do calor, da simplicidade que vinha junto com as luzes coloridas e os presentes à meia-noite.
Mas, ao olhar para os olhos dos meus filhos, que hoje já não correm pela casa na expectativa de um trenó no telhado, vejo que a magia talvez esteja ali, adormecida, esperando uma oportunidade para acordar.
Quem sabe ano que vem eu decida fazer algo diferente?
Talvez montar a árvore com mais calma, resgatar uma receita antiga, tirar as luzes do armário e deixar o espírito natalino entrar, mesmo que ele pareça mais tímido do que antes.
Porque, no fundo, o Natal não é sobre o que você fez.
É sobre o que você ainda pode fazer para que a vida continue tendo aquele brilho, mesmo que seja só o reflexo das luzes na janela.
Feliz Natal!
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